Em quais possibilidades o trabalhador pode demitir o seu patrão?

Sim, você pode demitir o seu patrão. Embora muitos trabalhadores não saibam que essa possibilidade existe, ela é mais comum do que imaginamos.
Não é novidade para ninguém que estamos passando por um momento muito delicado, não somente o Brasil, mas sim no mundo inteiro.
E o que a Pandemia acarreta nas relações de trabalho?
Acarreta que as empresas não estão conseguindo cumprir com as suas obrigações legais, diante da crise econômica que vive o País. E diante disso, muitas acabam não pagando o salário do funcionário corretamente, não deposita o FGTS corretamente, entre outras obrigações.
É importante, caro leitor, que você fique comigo até o final desse artigo, pois aqui vou te explicar todo o contexto da famosa “rescisão indireta”, que é a possibilidade do empregado demitir o seu patrão.
1) O que é a rescisão indireta?
A rescisão indireta pode acontecer quando a empresa comete uma falta grave com o seu funcionário ou quando não cumpre com as obrigações previstas no contrato de trabalho.
Afinal de contas, em quais possibilidades o trabalhador pode demitir o seu patrão?
O artigo 483 da CLT (Decreto Lei nº 5.452), dispõe o seguinte:
Artigo 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
Porém, nesse artigo, vou detalhar as possibilidades mais comuns de acontecerem. São elas:
a) Atraso no pagamento do salário;
Quando o patrão começa a atrasar com frequência o pagamento do salário do trabalhador, ele está descumprindo com uma obrigação contratual muito importante.
Sabemos que o salário recebido pelo trabalhador é para a sua subsistência e de sua família, então é obrigação do patrão efetuar o pagamento corretamente.
O pagamento do salário do funcionário que recebe na forma mensal deverá ser efetuado até o 5º dia útil do mês posterior ao trabalhado, ou seja, o empregado irá trabalhar os 30 dias para receber o salário no mês seguinte.
Quando a empresa começa a atrasar de forma habitual o pagamento do salário por 03 meses ou mais, o funcionário tem o direito de entrar com um processo trabalhista pedindo a rescisão indireta do contrato de trabalho, ou seja, nesse caso ele vai demitir o seu patrão, pois o mesmo não cumpriu com as obrigações mínimas previstas em um contrato de trabalho.
Afinal de contas, se o trabalhador prestou o seu trabalho para o seu patrão, nada mais justo que ao final do mês ele receber o valor que lhe é direito, não é mesmo?
Então o atraso do salário de forma habitual, dá o direito de o trabalhador entrar na Justiça do Trabalho para pedir todos os seus direitos.
b) Deixar de recolher o FGTS;
A segunda possibilidade de demitir o seu patrão é quando ele não está recolhendo corretamente o seu FGTS.
Mas aí você me pergunta como eu sei que o meu patrão está recolhendo o FGTS, sendo que no meu holerite todo mês vem falando que ele está depositando?
Isso é uma situação muito importante.
Embora no seu holerite esteja falando que o valor do FGTS foi depositado, não garante que está mesmo. E o que você pode fazer?
A forma mais segura é retirar um extrato do FGTS para conferência. Hoje com a tecnologia, o trabalhador pode baixar o aplicativo no seu celular e acompanhar todo mês se o seu FGTS está sendo depositado corretamente.
Muitos trabalhadores podem até pensar. Ah, mas é somente o FGTS. Não faz mal não ter o dinheiro aqui na minha conta, já que ainda estou trabalhando na empresa.
É aí que muitos deles se enganam.
E eu vou te contar por que.
Pode ser que no atual momento, o trabalhador não se importante tanto pelo seu empregador não estar depositando os valores todos os meses, mas quando ele é dispensado sem justa causa, por exemplo, e vai todo feliz na Caixa Econômica Federal para realizar o saque, quando chega lá, descobre que não tem nada depositado, aí é que entra a grande dor de cabeça.
Por isso, como eu disse acima, é de extrema importância o trabalhador acompanhar se o seu FGTS está sendo depositado corretamente.
Por fim, caso o funcionário ainda esteja trabalhando e descobre essa informação durante o contrato de trabalho, ele pode demitir o seu patrão por esse motivo, entrando com o processo trabalhista.
c) For assediado moralmente ou sexualmente;
Nesses casos, acontece quando o patrão cria um ambiente de trabalho que gera um dano à personalidade, a honra, a imagem e até mesmo a dignidade do trabalhador.
Quando isso acontece, o funcionário pode demitir o seu patrão.
Qualquer conduta abusiva por parte do patrão ou do seu gerente, por exemplo, acaba ameaçando a prestação de serviços pelo trabalhador e se isso acontecer, o trabalhador vai ficar totalmente desmotivado para trabalhar, já que o assédio moral ou sexual vai fazer com o que trabalhador fique abalado emocionalmente.
Dessa forma, quando a relação entre as partes se torna algo totalmente insustentável, o funcionário tem o direito de demitir o seu patrão, porém, nesse caso eu ressalvo a importância do empregado ter como PROVAR essa situação. Ele não pode simplesmente alegar que está sendo assediado, nesse caso, ele tem que provar o que está acontecendo.
2) E como provar o pedido de rescisão indireta?
Quando o trabalhador demite o seu patrão por meio da rescisão indireta, vai ser necessário entrar com um processo trabalhista, para que o Juiz aceite o pedido.
Mas para isso acontecer, o trabalhador tem que guardar todos os meios de prova possíveis para entrar com o processo trabalhista.
Se ele está sem receber o salário, ele precisar, por exemplo, tirar um extrato bancário comprovando que realmente a empresa não está fazendo o depósito bancário na sua conta.
No caso do FGTS, quando a empresa deixar de efetuar o depósito na conta do empregado na Caixa Econômica Federal, ele vai precisar ter o extrato da sua conta também.
É preciso de um pouco mais de provas, mas isso vai depender do está acontecendo com o trabalhador no caso em concreto.
O que ele tiver de provas, é bom guardar, como por exemplo, mensagens de texto, mensagens de WhatsApp, e-mails, fotografias e até mesmo testemunhas.
3) Quais verbas trabalhistas são devidas no pedido de rescisão indireta?
Se o pedido do trabalhador for aceito pelo Juiz, ele vai receber as seguintes verbas rescisórias:
· Saldo de salário;
· Aviso Prévio proporcional ao tempo de serviço;
· 13º proporcional;
· Férias vencidas se houver e proporcionais acrescidas de ⅓;
· Multa de 40% sobre o saldo de FGTS, além de ter direito ao saque do saldo existente na conta vinculada de FGTS;
· Direito ao recebimento de seguro desemprego se preencher os requisitos impostos pelo Ministério da Economia (antigo Ministério do Trabalho).
4) Como entrar com esse pedido de rescisão indireta?
Nesse caso, se o trabalhador estiver passando por alguma das situações que eu mencionei no começo do texto, ele deve procurar o seu advogado de confiança.
Após uma entrevista inicial com o advogado, ele vai entregar toda a documentação que tem referente ao contrato de trabalho, o advogado irá analisar toda a situação e vai dar um parecer para o trabalhador.
Se estiver tudo correto, o advogado irá entrar com uma reclamação trabalhista, pedindo que a empresa pague todos os direitos que são devidos ao empregado naquele caso em concreto.
Agora você me pergunta, se eu entrar com esse processo, eu preciso continuar trabalhando?
É uma escolha de cada trabalhador. Não existe uma resposta na Lei Trabalhista.
Se ele preferir, não precisa continuar trabalhando. Pode aguardar o processo terminar para ver qual decisão que o Juiz vai dar no seu processo.
Porém, caso o trabalhador decida em não continuar trabalhando, é necessário que o seu advogado envie uma notificação ou um telegrama para a empresa, informando que o trabalhador não continuará prestando o serviço para a empresa, porque entrou com um processo trabalhista pelas irregularidades cometidas pelo empregador, assim, o mesmo irá aguardar o fim do processo.
O trabalhador tem que estar ciente que o processo depende de uma decisão judicial e essa pode não ser favorável a ele.
5) Afinal de contas, vai dar certo?
Essa pergunta é bem comum. Porém, como tudo no Direito depende, aqui é o mesmo caso.
Nós advogados não podemos dar certeza do êxito no processo, pois nem tudo depende de nós.
Se o processo trabalhista for bem narrado, juntando todas as provas possíveis, sendo essas documentais, testemunhais etc., a chance de ter um resultado positivo, é mais garantido, mas ainda assim vai depender de uma decisão do Juiz.
O trabalhador passando por todos esses problemas, em que a empresa não está cumprindo com todas as obrigações do contrato de trabalho, o advogado irá contar todo o caso para o Juiz, vai juntar as provas e o Juiz vai decidir o caso em concreto.
6) E se não der certo, o que vai acontecer?
Caso o Juiz entenda que não é possível o trabalhador demitir o seu patrão, ele pode ter dois entendimentos:
Que o trabalhador peça demissão, caso não tenha mais interesse de continuar trabalho ou o Juiz pode entender pela continuidade do contrato de trabalho, assim, o trabalhador pode continuar trabalhando, ainda mais se o seu contrato de trabalho for por tempo indeterminado, ou seja, não tem data para acabar.
Tudo vai depender do caso em concreto e também do que a empresa vai decidir. Ela pode decidir por demitir o funcionário após o processo trabalhista finalizar. É necessário analisar o caso concreto.
Se o trabalhador ou o Juiz entender pelo pedido de demissão, o que o trabalhador vai receber de direitos trabalhistas?
No caso do pedido de demissão, o trabalhador recebe:
· Saldo de salário;
· 13º salário proporcional;
· Férias vencidas se houver e/ou proporcionais + 1/3;
· Aviso prévio se esse for cumprido;
· Quanto à multa de 40% do FGTS, ele não vai ter direito, bem como não tem direito ao seguro desemprego. Em relação aos valores já depositados na sua conta do FGTS, ele não tem direito ao saque. Importante ressaltar que ele não perde esses valores, apenas irá ficar retido na conta vinculado a Caixa Econômica Federal.
Conclusão:
É muito importante o trabalhador analisar se o seu contrato de trabalho está sendo cumprido corretamente pelo seu patrão e caso não esteja, ele deve reunir todas as provas para realizar o pedido de demissão do seu patrão.
O trabalhador deve ficar atento caso o seu patrão não esteja cumprindo com as suas obrigações legais, lembre-se: O contrato de trabalho é uma via de mão dupla, ou seja, o patrão precisa do seu trabalho para que a empresa cresça, mas para isso acontecer, ele deve pagar o funcionário corretamente e dar um ambiente de trabalho digno, como também deve cumprir com todos os direitos trabalhistas previstos na CLT e na Constituição Federal.
Fonte:https://tainaferreiraadv.jusbrasil.com.br/artigos/1194047158/em-quais-possibilidades-o-trabalhador-pode-demitir-o-seu-patrao?utm_campaign=newsletter-daily_20210416_11222&utm_medium=email&utm_source=newsletter